pediatra e psicanalista inglês
1896 – 1971
Desde a sua fundação em 1900 por Sigmund Freud, com a publicação do livro “ A Interpretação dos Sonhos “, a Psicanálise cresceu e se ramificou em diversas escolas e teorias, cada uma com suas próprias contribuições para o entendimento do “funcionamento” do aparelho psíquico humano. Uma dessas escolas, de grande relevância e influência na contemporaneidade, é a Escola Winnicottiana, fundada por Donald W. Winnicott .
Este trabalho tem como objetivo ampliar a compreensão da supramencionada Escola, a partir do desenvolvimento de 04 tópicos estruturais: Identificação do Contexto Histórico e Epistemológico; Diferenciação das Estruturas e Tipos Clínicos a Partir dos Casos Clínicos Freudianos; Correlação do Pensamento Freudiano e Pós-Freudiano com Suas Aplicações Clínicas, e por fim Intervenção em Demandas Contemporâneas a Partir dos Conceitos Psicanalíticos.
Ao longo das próximas seções, aprofundaremos esses pontos, fornecendo uma análise detalhada do legado de Winnicott e suas contribuições para a compreensão da mente humana e a prática clínica.
Donald Woods Winnicott (Plymouth, 7 de abril de 1896 — 28 de janeiro, 1971) foi um pediatra e psicanalista inglês
influente no campo das teorias das relações objetais e do desenvolvimento psicológico. Foi líder da Sociedade Britânica de Psicanálise Independente, e Presidente da Sociedade Britânica de Psicanálise duas vezes (1956-1959 e 1965-1968).
Winnicott é mais bem conhecido por suas ideias relacionadas ao verdadeiro e falso self, a teoria dos pais “suficientemente bons”, e em parceria com sua segunda esposa, Clare Winnicott, desenvolveu a noção de objeto transicional. Descreveu diversos livros, incluindo o “Brincar e a Realidade”, assim como outros 200 artigos.
Winnicott era filho de Elizabeth Martha Woods Winnicott e do Sr. John Frederick Winnicott, um comerciante que se tornou cavaleiro em 1924 após servir duas vezes como prefeito de Plymouth.
A família era próspera e aparentemente feliz, mas atrás desse verniz, Winnicott se viu como oprimido por uma mãe com tendências depressivas como também por duas irmãs e uma babá. Foi a influência do seu pai, que era um livre-pensador e empreendedor que o encorajou em sua criatividade. Winnicott se descreveu como um adolescente perturbado, reagindo contra a própria auto-repressão que adquirindo sua capacidade de cuidar ao tentar suavizar os sombrios humores de sua mãe. Estas sementes de autoconsciência se tornaram a base do interesse dele trabalhando com pessoas jovens e problemáticas.
A primeira vez que Winnicott pensou em estudar medicina foi enquanto ainda estava estudando na “The Leys School”, um internato em Cambridge, após fraturar sua clavícula, registrou em seu diário que possuía o desejo de poder curar a si mesmo. Começou a realizar estudos clínicos em biologia, fisiologia e anatomia na “Jesus College” em Cambridge em 1914, mas, com o início da Primeira Guerra Mundial, seus estudos foram interrompidos quando ele se tornou um estagiário temporário no hospital de Cambridge. Em 1917, entrou para a Marinha Real Britânica como médico chefe em um dos navios de guerra da Marinha Real Britânica.
Graduado em Cambridge como um dos alunos com menor nota, ele começou a estudar medicina clínica no hospital “St Bartholomew” em Londres. Durante este período, aprendeu por meio de seu mentor a arte de escutar cuidadosamente seus pacientes, enquanto coletava seus históricos médicos. Habilidade essa que se identificara posteriormente como fundamental para sua prática como psicanalista.
Winnicott finalizou seus estudos em medicina em 1920, mesmo ano em que se casou com a artista plástica Alice Buxton Winnicott (anteriormente, Taylor). Se casaram na igreja de “Saint Mary” em Frensham. Alice teve “diversas dificuldades psicológicas”, a partir disso, Winnicott providenciou o início de terapia para ela, assim como para ele para que pudesse resolver as questões geradas por esse problema. Ele obteve um cargo como médico-cirurgião no “Green Children’s Hospital” em Paddington, Londres, onde começou a atuar como pediatra e psicanalista infantil por 40 anos. Em 1923 ele começou sua terapia com James Strachey, que durou 10 anos. Strachey discutiu o caso de Winnicott com sua esposa, Alix Strachey, aparentemente compartilhando que a vida sexual de Winnicott era afetada por suas ansiedades. A segunda análise de Winnicott começou em 1936, com Joan Riviere.
Um acontecimento relevante da vida de Winnicott foi a chegada em Londres, no ano 1926, de Melanie Klein (1882-1960), uma das mais importantes analistas infantis da sua época, logo fazendo escola e seguidores. A convicção do Kleinianos na importância suprema, para saúde psíquica, do primeiro ano da vida da criança, foi compartilhada por Winnicott. Contudo esta visão diverge um pouco da de Freud e de sua a filha Anna Freud (1895-1982) – ela mesma uma analista de crianças, que também vieram para Londres em 1938, refugiados do Nazismo na Áustria. Esboçando-se uma divisão dentro da Sociedade Psicanalítica Britânica entre os Freudianos ortodoxos e o Kleinianos; mas ao final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, um acordo tipicamente britânico estabeleceu três cordiais grupos: os Freudianos, o Kleinianos e um grupo “conciliador” ao qual Winnicott pertenceu juntamente com Michael Balint (1896-1970) e John Bowlby (1907–1990).
Em sua obra, Winnicott busca enfatizar a importância das primeiras experiencias e relacionamentos no processo de maturação do indivíduo, tanto na formação de sua personalidade como no seu desenvolvimento emocional. Com um foco na complexidade das dinâmicas interpessoais e as influências das experiencias da infância na vida adulta, abordando questões fundamentais sobre a identidade, a criatividade e o bem-estar psicológico. Contribuindo dessa forma a uma compreensão mais holística do desenvolvimento humano e suas complexidades.
Para Winnicott, todo ser humano possui um potencial inato para amadurecer, dependendo assim do ambiente facilitador, que normalmente é proporcionado pela mãe, assim introduziu o conceito de Mãe suficientemente boa, enfatizando que o cuidador ideal é aquele capaz de atender as necessidades do bebê, porém permite que o bebê possa experienciar determinado grau de frustração e falha. Dessa forma, auxiliando num desenvolvimento saudável para o individuo que irá criar um repertorio de habilidades de adaptação a realidade.
Ligada a este conceito, estão outras duas definições de Winnicott, o “true and false self”, que em tradução seria o “verdadeiro e falso eu”, o autor diz que o verdadeiro self está ligado aos gestos de autenticidade e espontaneidade do bebê. Uma “mãe suficientemente boa” buscaria maneiras de se adaptar a esses gestos, sendo possível associar este self ao início da organização subjetiva. Enquanto o “falso eu” seria uma organização resultante dos perigos apresentados ao verdadeiro self, que seria decorrente de uma má adaptação materna, onde não há incentivo ao gesto espontâneo do bebê, que é interrompido, levando a criança a se adaptar ao ambiente. O autor afirma: “No caso da mãe não se adaptar suficientemente bem ao bebê, o lactente é seduzido à submissão, e um falso self submisso reage às exigências do meio e o lactente parece aceitá-las” (Winnicott, 1960/1983, p. 134). Ou seja, em um ambiente não suficientemente bom, o falso self serve como uma defesa para a continuidade do verdadeiro self.
Durante esse processo somos apresentados ao conceito de “holding”, que para Winnicott é um elemento essencial para o desenvolvimento da criança, onde o cuidador oferece um ambiente regado a cuidado, suporte emocional e segurança para a criança. Este é o momento em que a criança aprende a regular as suas emoções e construir uma sensação de continuidade e segurança, influenciando também na forma em que se relaciona com o mundo e as pessoas. Esse conceito nos leva a teoria das relações objetais de Winnicott, onde ele se concentra nas experiencias interpessoais e na maneira como as relações com objetos de apego moldam o indivíduo.
Seguindo essa linha de relações objetais, as crianças normalmente desenvolvem um forte apego a alguns objetos, como chupetas, bichos de pelúcia, brinquedos, entre outros. Os objetos de apego fornecem conforto e segurança, o que ajuda a criança a enfrentar separações e a regula emocionalmente durante o desenvolvimento. Além disso os objetos servem como uma transição entre o mundo interno da criança e o mundo externo. Esses dois “mundos” são o que Winnicott nomeou como “espaço transicional”.
O trabalho de Donald Winnicott se baseia em algumas das ideias fundamentais de Sigmund Freud, especialmente no que diz respeito à teoria psicanalítica do desenvolvimento e à importância da sexualidade na psicologia humana. No entanto, Winnicott também introduziu conceitos e teorias que representam divergências significativas em relação a Freud, tais como:
Winnicott concorda com Freud em relação à importância da infância no desenvolvimento da personalidade, mas ele enfatiza ainda mais a importância do ambiente e do papel da mãe no desenvolvimento do self do bebê.
Enquanto Freud focava na sexualidade infantil, Winnicott se concentra na “mãe suficientemente boa” e na ideia de um ambiente facilitador para o desenvolvimento saudável.
Winnicott desenvolveu o conceito de “objeto transicional”, que não era central na teoria freudiana. Isso se refere a objetos, como ursinhos de pelúcia, que as crianças usam para se acalmar e que desempenham um papel importante na transição do mundo interno para o mundo externo.
Winnicott também introduziu a ideia de “fenômeno de ilusão” e “espaço potencial”, destacando a importância de criar um espaço intermediário entre o indivíduo e o ambiente.
Em resumo, Winnicott construiu sobre as ideias de Freud, mas introduziu importantes divergências em sua teoria, enfatizando o papel do ambiente e da relação mãe-bebê, além de conceitos únicos que se tornaram fundamentais na psicanálise winnicottiana.
As contribuições de Winnicott enriqueceram a concepção psicanalítica sobre as bases do desenvolvimento emocional precoce (Winnicott, 1945/1978), principalmente no que concerne ao conceito de fenômenos e objetos transicionais, produzidos em uma área intermediária situada entre o mundo interno e o mundo externo. Winnicott formulou uma concepção sobre a constituição do mundo interno bastante original, afastando-se da doutrina freudiana à medida que não recorre à teoria pulsional. Se para Freud o objeto é pensado como objeto da pulsão (Laplanche & Pontalis, 1967/1983), na vertente winnicottiana o objeto adquire outro estatuto, relacionado à experiência da transicionalidade e não mais à organização pulsional do sujeito.
A importância da obra de Winnicott para a psicanálise vem sendo reafirmada nos últimos anos. Seu interesse para o campo das psicoses, em particular para a investigação da esquizofrenia, tem sido cada vez mais valorizado, à medida que essa patologia é caracterizada essencialmente pelo transtorno do pensamento, e a preocupação com o desenvolvimento da capacidade de pensar por conta própria é um traço distintivo da psicanálise winnicottiana.
Winnicott (1963c/1983) considera que, para compreendermos as desordens do tipo da esquizofrenia, é necessário examinarmos os processos de maturação nos estágios iniciais do desenvolvimento emocional, uma época em que muito desse desenvolvimento está se iniciando e nenhum processo se completando. Nesse momento, as tendências básicas correspondem à maturação e à dependência.
Em decorrência de suas atividades clínicas de pediatra e psicanalista e de sua refinada capacidade de observação e sensibilidade, Winnicott abriu uma nova perspectiva para a atividade clínica, ao mesmo tempo em que formulará uma teoria do amadurecimento pessoal.
O trabalho de Winnicott abre-nos possibilidades de analisar pacientes difíceis, com a teoria do “amadurecimento pessoal” e o uso dos fenômenos de “regressão à dependência” na interação paciente/analista, que fornece o holdingnecessário e deve decidir quando falar e quando silenciar, particularmente nas situações de “descongelamento” do trauma, quando a aceitação das críticas do paciente às falhas do analista, sem revidar ou se justificar, é um importante elemento de retomada do desenvolvimento, sobretudo em casos de pacientes bordelines, esquizóides e narcísicos graves, nos quais o mais importante é a sobrevivência do analista.
Winnicott, de certo modo, manteve a conceituação de transferência como aplicável aos pacientes que, em seu amadurecimento, já haviam atingido o estado de integração, já habitavam o próprio corpo, tinham um limite separando o eu do não-eu e já podiam se relacionar como pessoas totais com outras pessoas totais; neles já se constituía um consciente e um inconsciente dinâmico, com a censura e a repressão. Nesses pacientes, o passado recalcado viria ao presente na relação analítica. Entretanto, no grupo que não atingiu esse estado evolutivo, não se pode falar de transferência, mas de viver pela primeira vez, na relação analítica, os cuidados ambientais adequados– o passado não vem ao presente; o presente deve ser o passado que não aconteceu. Isto se dá quando ocorre o fenômeno da regressão à dependência absoluta.
Diante de tudo que foi explanado anteriormente, conclui-se que a escola Escola Winnicottiana, fundada por Donald W. Winnicott, teve grande relevância no cenário das teorias que buscaram explicar o aparelho psíquico humano. Winnicott buscou enfatizar a importância das primeiras experiências de amadurecimento do ser humano na construção da sua psique e no seu desenvolvimento emocional, trazendo ideias inovadoras como a da existência de um mundo interno e externo em cada pessoa.
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PEDRO CORDIER DE ALMEIDA NETTO;
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YASMIN SILVA SANTANA.
LAIZ CARDOZO PAOLILO
CENTRO UNIVERSITÁRIO FACULDADE DE TECNOLOGIA E CIÊNCIAS